domingo, 25 de maio de 2008

Maria, Maria

Há alguns anos, quando eu ainda subia em árvores e jogava “queima”, tínhamos uma habitante muito alegre aqui na rua, era a Dona Maria, ela era baixa, morena, com cabelos bem compridos, feição de uns 60 anos ou mais, morava numa casinha de esquina. A dona Maria gostava de cantar... ela cantava desde que acordava até ir dormir, com pausa apenas para as refeições e as orações do dia. Eu sei por que vivia por lá, passei muitas tardes na casa da Dona Maria, sentada na cozinha, comendo biscoitos de polvilho e ouvindo-a cantar. Dona Maria cantava coisas do Brasil lá de cima; cantigas de roda, canções sobre a tristeza da seca e sobre a alegria do amor... Na época eu num sabia distinguir nada, mas admirava muito... aprendi algumas músicas, cantava junto, e vivia dizendo pra ela que ela devia ir pra televisão... ah, crianças...rsrs... Nunca tinha parado pra pensar nisso, mas talvez, ela seja uma das responsáveis pela minha paixão louca por música... Eu achava que ela era feliz, a adulta mais feliz que eu conhecia.
Hoje em dia a Dona Maria ainda mora no mesmo sobradinho, na esquina da Botuporã com a Brito Machado, ainda é morena e tem cabelos cumpridos, mas não é mais vista, e muito menos ouvida... Andei perguntando pela rua e ninguém sabe dizer como ela está... As pessoas só dizem “Dona Maria, aquela que é louca? Num sei...” apenas minha vó que é mais inteirada sobre os acontecimentos da vizinhança soube me dizer... Disse que ela era louca, que o marido já não agüentava mais e começou a dar uns remédios pra ela ficar quietinha...
E assim morre uma grande cantora... a Dona Maria está lá... respira, come, fala... mas usa drogas pra não cantar.... Toma remédios pra assassinar seu talento, sua paixão...O que eu tenho a dizer sobre isso? Nem sei... só que estou de luto... por uma voz, por uma alma.

“Olê muié rendera,
Olê, muié rendá,
Tu mi insina a fazê renda
Qui eu ti insino a namorá...
Tú mi insina a fazê renda,
Qui eu ti ensino a namorá"